sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Saúde na Escola



Lygia Luiza Schmal Moreira 1
Isa Maria Bezerra de Queiroz 2
A vida moderna vem exigindo que as áreas sociais desenvolvam programas e projetos compatíveis com as exigências e necessidades da população brasileira. Esta preocupação permanente com os cenários e as diversificadas formas de se investir na promoção da saúde constitui-se em uma das estratégias que fundamentam a ação coletiva que se construirá a cada dia, conforme o ambiente e estrutura de cada comunidade, quer seja na família, nos grupos comunitários, na educação, nas unidades de saúde e no trabalho.
Sob esta ótica está se estruturando um painel que vem colocando os profissionais de saúde e os educadores frente a novos desafios no desenvolvimento de ações educativas em saúde. Em um mundo globalizado e em permanente transformação, observa-se a existência emergente de uma educação, de uma ética e de uma cultura voltadas para a diversidade - afinal, vive-se o tempo de uma sociedade multicultural cuja diferença é a essência, e, por isso, faz-se necessário que as pessoas sejam capazes de reconhecer tais diferenças e respeitá-las. Este cenário requer a integração de ações de saúde e educação, bem como a adoção de novas posturas e formas de atuação profissional que encontram, na escola, um ambiente propício e desafiador. No espaço escolar, a criatividade é fundamental para que professores, alunos e comunidade apreendam juntos o sentido da vida e do mundo. Nesta direção, o entendimento das diferenças existentes e a criação de um ambiente favorável à convivência, em que os conflitos poderão ser trabalhados, requer o conhecimento da realidade e do cotidiano do aluno, do professor e da comunidade.
A articulação do saber, do conhecimento, da vivência diária com a comunidade, traduzida na prática de uma ação escolar coletiva e solidária, leva crianças, adolescentes e adultos a terem uma experiência rica no contexto escolar.
Na idade escolar - uma fase importante para o desenvolvimento humano - é fundamental que sejam implementadas estratégias de ação voltadas para a saúde no sentido de promover a auto-estima, o desenvolvimento de habilidades e de comportamentos saudáveis.
Com os desafios existentes na área de saúde, especialmente no enfrentamento dos problemas que afetam a população e que estão relacionados com uma melhor qualidade de vida, torna-se necessário que novos conceitos e paradigmas sejam abordados mediante a proposição de novas estratégias.
Recorremos a Paulo Buss, 1998, que enfatiza a importância da atenção à saúde da criança que deve "ter sempre como eixo o crescimento e desenvolvimento desse sujeito, que lhe confere a especificidade e a vulnerabilidade próprias. Dessa forma, a atenção à saúde para essa idade da vida deve ter como foco estratégias que concorram não somente para a superação dos danos físicos, mas que ao enfrentarem também seus determinantes propiciem o cuidado integral". Portanto, é estratégico que crianças, adolescentes e adultos comecem a desenvolver suas relações com a saúde, direcionando ações e atividades vinculadas aos espaços da vida cotidiana e à organização de conteúdos voltados para o atendimento das demandas destes atores.
As relações espaciais - a família, a escola, a comunidade e os serviços de saúde - sempre identificadas com as condições sociais e os diferentes estilos de vida - são importantes para o crescimento e desenvolvimento de aptidões para se viver com saúde. Ainda, conforme Paulo Buss, os seguintes assuntos merecem ser abordados com freqüência pela escola: "crescimento e desenvolvimento, educação em saúde, hábitos e vida saudável, arte/lazer/exercícios físicos, alimentação/vigilância nutricional, controle das condições sanitárias de moradia e da escola, violência, educação para o trânsito, saúde oral, saúde sexual, saúde reprodutiva, saúde mental, imunização, prevenção de dependência química, prevenção de DST/AIDS, controle de acuidade visual e auditiva, controle de doenças respiratórias, infecciosas e parasitárias."
Experiências pedagógicas de educação em saúde vêm sendo assinaladas em todo o país. As dimensões dos problemas sociais se multiplicam e a intervenção compartilhada entre os segmentos sociais e as forças vivas da comunidade se constroem lentamente, não sendo possível alcançar, em curto espaço de tempo, solução para esses problemas. Entre essas experiências consideram-se como válidas aquelas que implementam a promoção da saúde. No caso da escola, a implementação de ações de promoção da saúde está comprometida com a melhoria dos padrões de vida das crianças, adolescentes, adultos e da comunidade em geral.
Promover saúde na escola significa, por exemplo, atentar para questões relacionadas à gravidez na adolescência; à incidência de doenças sexualmente transmissíveis e AIDS, decorrentes de uma atividade sexual que se inicia cada vez mais cedo e sem a devida proteção; aos hábitos alimentares e à adoção da atividade física; aos acidentes e à violência. Promover saúde na escola, neste sentido, implicará, portanto, o desenvolvimento de ações em consonância com as aspirações sociais e as necessidades emergenciais da comunidade onde está inserida.


Escola como ambiente saudável


Profissionais e especialistas de diversas áreas têm se preocupado com a situação das comunidades onde vivem as pessoas e têm procurado contribuir para a qualidade de vida de todos os cidadãos de uma comunidade, onde a responsabilidade é compartilhada entre os vários atores sociais que a compõem e onde a ação coletiva traduz-se numa visão integral do ser humano em suas essências física, mental e social.
Neste cenário, é fundamental a vinculação dessa ação com a construção da cidadania e com a administração de ações e atividades programadas que reconheçam a interdependência entre os mais diversos fatores: cultura organizacional, mentalidade dos profissionais, funções e processos que cada pessoa responde. Esses aspectos merecem uma atenção contínua, flexível e a busca da integração entre os diferentes segmentos que compõem o ambiente educativo.
Os segmentos da escola contribuem para que o ambiente escolar seja favorável à saúde. Com condutas simples e a participação de todos, aos poucos se construirá um ambiente agradável e evidentemente mais saudável. Promover a abertura de espaços ociosos às reuniões de grupos específicos, seja de igrejas, associações de moradores, sindicatos, associações beneficentes, familiares e outros, tende a possibilitar que mais pessoas venham a participar da vida escolar e a tornar a escola um centro irradiador de conhecimentos, cultura e saúde.
Quando a comunidade se apropria da escola como seu espaço, poderá evitar atos de vandalismo (depredações, roubos e assaltos). Dessa forma, será possível construir e consolidar, com parceiros comprometidos com a educação e com a saúde, projetos sociais que possam apoiar a escola na solução dos problemas referentes à violência entre as crianças, adolescentes e adultos. A violência contra a criança, o adolescente e as famílias é um tema social emergente e que aflora ou mesmo se reflete no ambiente escolar. No local, são inúmeras as abordagens sobre a violência e suas conseqüências.
A valorização do cotidiano da escola e a elaboração de um projeto político-pedagógico, no qual a promoção da saúde esteja incluída, são importantes para que se estimule o indivíduo e a comunidade a desenvolverem habilidades para uma vida mais saudável, garantindo processos de aprendizagem que respeitem os direitos dos cidadãos. Trabalhar programas e projetos sociais envolvendo grupos diversos em atividades integradas desenvolve a auto-estima, o respeito mútuo e a troca de experiências, o que pode contribuir para a criação de um clima de afetividade que pode ser incorporado à vida dos indivíduos. A implementação de atividades artísticas, esportivas e culturais enriquece a ação na escola e na comunidade e representa o respeito à identidade histórica e social. Com a diversidade de ações e atividades voltadas para uma vida mais plena de sentido, a comunidade será estimulada em sua capacidade de desenvolver a percepção crítica para a tomada de decisões que impliquem uma vida mais saudável.


Temáticas sociais - escola, saúde e cidadania


A proposta de uma educação voltada para estimular e desenvolver nos alunos o exercício da cidadania, de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997, vol. 8, p.22), indica como princípios orientadores a "dignidade da pessoa humana, a igualdade de direitos, a participação e a co-responsabilidade pela vida social". Neste enfoque, garantir a dignidade e o exercício da cidadania é tarefa de todos. A cidadania é exercida quando áreas afins, principalmente a saúde e educação, desenvolvem integradamente suas ações diárias. O compromisso com a construção da cidadania reflete "uma prática educacional voltada para a compreensão da realidade social, dos direitos e responsabilidades em relação à vida pessoal, coletiva e ambiental" (PCN, vol.8.).
A saúde relaciona-se com o meio ambiente em que vivemos, a estrutura da sociedade e das famílias e os hábitos pessoais de vida. É a relação do ser humano com ele mesmo, com o seu mundo social e o seu ambiente. É também uma relação da sua história e da história social em que está inserido. Na escola, a saúde e a cidadania são temáticas sociais que se complementam e devem ser objeto de interesse e preocupação dos atores responsáveis por sua incorporação à vida dos alunos e da comunidade em geral.
Nessa perspectiva, trabalhar a cidadania e a saúde como temas maiores que permeiam a sua vida diária - utilizando-se, para isso, das manifestações culturais próprias da comunidade, do município, estado e país e buscando recuperar valores e vivências sociais - torna a vida mais repleta de sentido humano.


O fracasso escolar


O desenvolvimento de ações e atividades que contribuam para a permanência e inclusão dos alunos na escola e para afastar os riscos da evasão escolar, repetência e defasagem idade/série se apresenta como mecanismo de apoio a uma ação integrada entre a educação e a saúde. O teatro, a música, o desenho, as manifestações culturais, as atividades físicas e o reforço escolar se constituem estratégias viáveis para o resgate de valores e a auto-estima desse segmento.


Prevenção de drogas / Aids / Gravidez na adolescência


Prevenir o uso de drogas, no contexto escolar, é importante. A escola tem realizado, com crianças, adolescentes, adultos e comunidade, rodas de conversa, projetos de protagonismo juvenil, atividades físicas, coral, banda, peças de teatro e outras manifestações culturais próprias da comunidade que têm contribuído para uma melhor abordagem deste tema.
O trabalho sobre DST/AIDS na escola vem se constituindo como uma nova postura ética de envolvimento de toda a sociedade com o tema, cuja discussão é indispensável e deve estar permanentemente presente no cotidiano escolar. Considerando o contexto atual, é importante que a escola construa com os alunos o conhecimento sobre as DST/AIDS como uma urgência social. Temas dessa natureza vêm sendo estabelecidos como uma decorrência das necessidades emergenciais da sociedade que, atualmente, ressente-se de um envolvimento maior das diversas áreas sociais com o problema.
A gravidez na adolescência é assunto cada vez mais presente na vida diária da escola. A gravidez precoce ocorre, na maioria das vezes, em momentos de indefinição, indecisão e, sobretudo, falta de conhecimento sobre a educação sexual, sexualidade e planejamento familiar. Nessas circunstâncias, o espaço escolar torna-se cada vez mais importante, pois é fundamental seu engajamento na discussão desse temas, buscando, em conjunto com a comunidade, especialmente os pais, desenvolver de forma coletiva programas e projetos comprometidos com o bem-estar e a saúde da população escolar.
Nos novos cenários propostos, estabelece-se a necessidade de reconstrução dos saberes da educação e da saúde.


Relação da escola com o SUS


A relação da escola com o Sistema Único de Saúde/ SUS será construída mediante um comprometimento maior dos profissionais envolvidos no processo. Exemplos de uma ação conjunta têm sido assinalados no Brasil e indicam uma ação mais comprometida com a promoção da saúde, a prevenção de doenças e cuidados básicos de atenção à saúde.
O processo de construção de vida saudável envolve as áreas de saúde e educação e fortalece o enfoque de saúde como qualidade de vida. Para que este processo tenha êxito, além da saúde e educação devem também ser envolvidos os demais setores sociais, buscando atender às necessidades das escolas e comunidades.


A construção de parcerias

Construir parcerias entre os setores sociais vem exigindo um exercício pleno de compartilhamento, quer seja institucional - educação, saúde, justiça, trabalho, meio ambiente -, quer seja por parte da sociedade civil organizada: associações, sindicatos, igrejas e outros grupos.
Com os setores sociais já referenciados, é possível estabelecer ações compartilhadas que venham a consolidar uma prática social coletiva e a construção de relações voltadas para a participação e o apoio à ação escolar.
Pontos para reflexão
1) Como introduzir hábitos saudáveis de vida?
2) Como abordar o meio ambiente - lixo, endemias, etc. - de forma articulada com a conscientização de uma questão ambiental mais geral?
3) Como incentivar a construção de relações mais solidárias?

Bibliografia
BRASIL. MEC/SEF. Parâmetros Curriculares Nacionais, vol. 8. Brasília, 1997.
BUSS, Paulo Marchiori et al. Promoção da saúde e a saúde pública: contribuição para o debate entre as escolas de saúde pública da América Latina. Rio de Janeiro, 1998, versão preliminar. Mimeo.
ESCOLA PROMOTORA DA SAÚDE. In: Revista Promoção da Saúde, Ministério da Saúde, Brasília, v. 1, no 1, ago./out. 1999, p. 40-43.
GADOTTI, Moacir et al. Perspectivas atuais da Educação. Porto Alegre: Artmed Editora, 2000.
MARTÍNEZ, Albertina Mitjáns. Psicologia escolar e educacional, v. 1, no 1, p. 19-24, 1996. Mimeo.

1 Consultora da Coordenação de Promoção da Saúde do Ministério da Saúde.
2 Assistente Social do Ministério da Saúde.

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